SALÃO DE “BELEZA LIMPA” SE TRANSFORMA EM REFERÊNCIA NA AMAZÔNIA
A empresária Manuella Barbosa trocou os alisamentos e progressivas por rituais com bioativos da floresta. Hoje, seu Espaço NUMA antecipa os debates climáticos da COP30 com práticas sustentáveis e cosméticos vegetais
Sábado, 23/08/2025, 09:23
A floresta está dentro do salão e não apenas como decoração. A emergência climática, e consumo mais consciente, fizeram com que setores que antes pareciam distantes da pauta ambiental começassem a se reinventar.
A indústria da beleza — uma das que mais crescem no mundo — também sente essa pressão. Entre escovas progressivas e cosméticos industrializados, cresce um movimento que busca mais do que estética: quer saúde, ética e propósito.
Em Belém, essa mudança tem nome e endereço. O que antes era o Manuella Hair Club, hoje é o Espaço NUMA, primeiro ‘salão de beleza limpa’ da Amazônia, criado pela empreendedora Manuella Barbosa. Com mais de 20 anos de atuação, Manuella abandonou os padrões mais tradicionais e construiu, tijolo por tijolo, uma proposta radicalmente diferente: menos química, mais floresta; menos tendência, mais verdade.
“Eu seguia o que o mercado mandava. Fazia progressiva, alisava, vendia o que se esperava. Mas com o tempo, fui questionando tudo isso. Via cabelos fragilizados, mulheres insatisfeitas e me sentia mal com a quantidade de agressões que a gente aceitava como normal”, relembra.
Esse incômodo virou estudo, pesquisa, reconexão com saberes amazônicos tendo como foco mudar e ajudar a desenvolver a região onde se abriga a maior floresta tropical do planeta.

“Descobri que a floresta já tinha tudo. O que faltava era coragem de mudar.
E eu escolhi mudar”
Manuella Barbosa
Empresária
Com duas décadas de experiência no setor, Manuella Barbosa passou a representar uma nova geração de empreendedores amazônidas, no qual, segundo a própria, aqueles que escolhem o caminho mais difícil, porém mais verdadeiro: empreender com responsabilidade, respeitando o bioma e quem vive nele.
“Eu deixei os padrões para trás. Hoje, lidero um projeto que pode inspirar o Brasil e o mundo: mostrar que é possível transformar realidades e cuidar da natureza ao mesmo tempo”, disse.
DO SALÃO TRADICIONAL AO ESPAÇO DE CURA
Segundo Manuella, a transição foi intensa. Fisicamente, o espaço foi reformulado. Conceitualmente, o negócio ganhou um novo propósito. Com isso, emoções também precisaram ser reorganizadas. “Eu tive que reaprender tudo: comunicar, vender, empreender. Não foi só trocar de nome. Foi assumir uma nova visão de mundo”, diz ela. O Espaço NUMA, hoje, oferece uma experiência que ultrapassa o cuidado estético. Manuella explica que todo procedimento é um ritual. Os produtos — criados pela própria empresária — levam ativos da floresta, como óleos e manteigas vegetais, aplicados com escuta e respeito ao tempo do corpo. “É ciência com alma.”
Ela afirma que no começo, o novo modelo causou estranhamento entre suas clientes. “Achavam que o natural não teria resultado. Mas quando sentiram a diferença no couro cabeludo, no brilho do fio, na leveza da experiência… não queriam mais voltar ao modelo antigo. Hoje, o público do NUMA valoriza exatamente isso: o cuidado sem agressão”, conta.
De acordo com ela, é comum alguns clientes confundirem produtos naturais como sendo veganos, porém, Manuella esclarece que a linha de produtos NUMA não se define como vegana — e isso é proposital.
“Nem tudo que é vegano é natural. Aqui usamos ingredientes de origem vegetal, minimamente processados, com potência e rastreabilidade. É diferente. É a floresta viva em cada frasco”, relata.





AMAZÔNIA, COP30 E SOLUÇÕES JÁ EXISTENTES
Com a realização da COP30 em Belém, os olhos do mundo se voltam para a Amazônia e sua relação com a crise climática. Para Manuella, o Espaço NUMA representa uma resposta concreta a essa urgência. “A COP30 não é um ponto de partida. É uma vitrine. O projeto já está pronto.”
Ela acredita que o autocuidado pode ser um ponto de partida para o cuidado ambiental. “A beleza limpa é uma forma de regeneração. Pra gente e pro planeta.”
Logo, o espaço NUMA vai muito além do discurso ecológico e inovador. O salão adota práticas ambientais no dia a dia como:
- Compostagem de resíduos capilares, com a @compostabelem
- Captação e uso da água da chuva
- Energia eólica e claraboias para reduzir o uso elétrico
- Ecoponto ativo para descarte consciente de plásticos
- Parcerias com catadores, gerando renda local
- Apoio a projetos de educação e empoderamento feminino
Para o desenvolvimento dessas ideias, partindo dos ideais de sustentabilidade, bioeconomia, desenvolvimento e floresta amazônica de pé, Manuella conta com a parceria e consultoria de entidades que se destacam através de ações que fazem toda a diferença. Esse é o caso da Associação Comercial do Estado do Pará (ACP) e da Composta Belém.
COMBATE AO GREENWASHING
Nem tudo que se vende como sustentável de fato o é. O greenwashing, ou lavagem verde, em português, segundo o Ministério da Justiça e Segurança Pública, é uma estratégia de marketing comum e ilusória na qual empresas promovem seus produtos como ambientalmente responsáveis sem cumprir os critérios reais de sustentabilidade.
E para combater essa prática enganosa, Manuella Barbosa afirma que é comum alguns clientes confundirem produtos naturais como sendo veganos, porém, ela esclarece que a linha de produtos NUMA não se define como vegana, e isso é proposital.
“As pessoas foram acostumadas a comprar o que as indústrias disponibilizam e existe muito greenwashing. As fabricantes vendem uma ideia de que um determinado produto seria vegano. Para o leigo, ele acredita que ele está comprando ou que ele esteja usando algo saudável. No entanto, aquele produto vegano pode não ter nada de origem animal, mas ser um produto todo sintético. É essa a grande diferença, enquanto os cosméticos NUMA são vegetais, porque eles são todos de origem vegetal e natural”, alerta.
Diante disso, a proprietária do Numa reforça que é preciso investir também em informação adequada e qualificada. “Essas práticas advém de uma falta de informação, e hoje é um trabalho que eu faço, de conscientização do que você usa, do que você passa na sua pele, do que você faz com você e com o planeta. Orientar sobre as substâncias químicas que fazem mal para a sua saúde. E essas substâncias também fazem mal para o planeta, porque muitas dessas encontram-se em cosméticos, e acabam virando plástico, indo parar no meio das ruas, da floresta, nos oceanos e demoram décadas para se decompor”.
INOVAÇÃO E TECNOLOGIA: COP 30 DEVE SER VISTA COMO O COMEÇO
Manuella Barbosa afirma que a realização da COP 30 em Belém é uma grande oportunidade de apresentar para o mundo que a região amazônica vai muito mais além de florestas. Há pessoas e elas estão realizando inovações com base no que a Amazônia tem para oferecer para seu povo.
“A COP 30 é uma grande oportunidade de mostrarmos para o mundo que a Amazônia não é só floresta, ela também é inovação. Porque daqui nós podemos mostrar o que nós já estamos fazendo. E o movimento Numa segue o mesmo caminho, com os produtos. São bioativos da floresta, com rastreabilidade, com escolhas reais. Esse grande evento não é o início, enxergo ele como a chance de mostrar que estamos prontos e passar para o mundo essa realidade nossa, e do que estamos fazendo. Saber que a mulher não apenas está lavando o cabelo, ela está fazendo escolhas certas. Tem consciência de que aquela ação não está agredindo o meio ambiente, e de quebra, está cuidando da sua própria saúde”, reforça.
A transformação completa do Espaço Numa contou com o auxílio da consultora em estratégias para sustentabilidade Camille de Vasconcelos Anijar. Ela, que é coordenadora da Câmara Setorial de Meio Ambiente e Sustentabilidade da Associação Comercial do Estado do Pará (ACP), ressaltou que o processo visou alinhar o espaço com a Agenda 2030 da ONU.
“Essa transformação começou a partir da preocupação que a Manuella sempre teve com o meio ambiente e a emergência climática. Por isso, alinhamos as ações aqui do espaço com os objetivos de desenvolvimento sustentável da Agenda 2030 da ONU e assim, reduzindo os impactos negativos da atividade, otimizando os recursos da chuva, por exemplo. Então, é muito gratificante ver o espaço Numa, hoje, como o primeiro salão de Beleza Limpa da região Norte. Sendo exemplo de conscientização, não só para os clientes, mas para outros salões”, conta Camille.
Camille Anijar acredita que pensar de forma sustentável deixou de ser uma escolha para se tornar um compromisso obrigatório com o futuro. “Eu costumo dizer que essa economia não é mais uma referência. Para mim, ela é obrigatória para que a gente possa ter um futuro melhor”, afirma.
Com a perspectiva da aprovação da Zona Franca da Bioeconomia no Pará, modelo semelhante ao de Manaus, no Amazonas, Camille destaca que o estado começa a se posicionar como referência em inovação e sustentabilidade. “Muitas pessoas já estão vindo para cá, principalmente porque nós já vamos ter, com a ajuda de Deus, a aprovação da Zona Franca da Bioeconomia. Com isso, teremos vários tipos de injeções econômicas após essa aprovação.”
Ela ressalta ainda o papel fundamental da COP30 nesse processo. Segundo Camille, o evento internacional traz consigo um importante legado de transformação. “A COP30 é uma luta. Não podemos deixar de citar isso. Ela está conscientizando não só os empresários, mas toda uma coletividade. Quando você vê alguém fazendo, também quer realizar. E a população aqui no estado já começa a seguir exemplos.”
Conforme foi é possível ver no vídeo, para a coordenadora, a COP30 será um divisor de águas para o Pará, não apenas pelas obras grandiosas que o estado está recebendo, mas principalmente pela mudança de mentalidade. “A COP 30 vai ser um grande marco. Acho que haverá um antes e um depois dela. O Pará merece essas obras, claro, mas o mais importante é a conscientização. As pessoas vão passar a enxergar o meio ambiente como algo que gera lucro também. Cuidar do planeta passa a ser um investimento. Sustentabilidade deixa de ser um gasto para se tornar retorno.”
Camille também chama a atenção para os efeitos das mudanças climáticas sentidas no dia a dia. “Esse calorzão que estamos vivendo é resultado do aumento do efeito estufa. Quando você não separa seu lixo, por exemplo, ele vai para o aterro sanitário e gera CO2. São práticas simples que, se mudadas, já causam impacto positivo.

ATUAÇÃO DA ACP PELA SUSTENTABILIDADE
A atuação da Câmara Setorial da ACP tem se destacado justamente por fomentar essas mudanças. “Nossas ações são baseadas em três eixos: ambiental, social e econômico. Promovemos palestras educativas e lançamos várias cartilhas, como a ODS Descomplicados, Educação Ambiental, Resíduos Sólidos, e ainda teremos cartilhas sobre Mudanças Climáticas e COP 30 no segundo semestre”, esclarece Camille.
Segundo a coordenadora da ACP, para facilitar o engajamento das empresas, a Câmara também disponibilizou placas de sinalização baseadas na Agenda 2030 da ONU, que os associados podem baixar no site da instituição. “Queremos primeiro conscientizar nossos associados, para que eles possam investir no desenvolvimento sustentável.”
Uma das ações mais recentes foi o lançamento do Selo ACP de Boas Práticas, voltado para empresas que adotam ações sustentáveis. “Esse selo é baseado nos princípios do ESG e pode ser solicitado por meio da plataforma no nosso site, na aba COP 30. Os associados inscrevem as práticas que já realizam, e uma comissão avalia. Se aprovadas, recebem o selo, que será classificado em três categorias: Prata (para quem atende 50% das exigências), Ouro (75%) e Diamante (100%).”
Além do reconhecimento simbólico, o selo ACP será materializado em um adesivo redondo para que as empresas possam fixar em suas entradas ou vitrines. Segundo Camille, essa certificação pode se tornar um diferencial importante. “Já existem editais exigindo comprovação de ações sustentáveis. O selo ACP visa estimular justamente isso: práticas que reduzam os impactos negativos no meio ambiente, otimizem o uso de recursos e promovam a mitigação da emissão de carbono.”
Outra frente de trabalho destacada por Camille é o fortalecimento do lado social da sustentabilidade. “Quando começamos a coleta seletiva, vimos que também estávamos gerando emprego e renda. Hoje temos um grupo de cooperativas que é beneficiado diretamente por essa iniciativa.”
Ela também combate a ideia de que ser sustentável é caro. “Muita gente acredita que adotar práticas sustentáveis pesa no bolso. Mas é o contrário. Vamos a um exemplo simples: uma empresa que usa mil copos descartáveis por mês pode trocar por copos ecológicos ou garrafinhas reutilizáveis. No começo tem um custo, sim, mas ao longo de um ano, esse custo é reduzido.”
Além disso, a coordenadora da ACP ensina que separar o lixo e encaminhá-lo a cooperativas pode gerar renda. “Hoje temos empresas que pagam R$ 1,50 por litro de óleo de cozinha usado. São práticas acessíveis que não exigem grandes investimentos. E não tem coisa melhor do que cuidar do planeta e ainda sentir o retorno disso.”
Camille encerra com um convite à reflexão: “Convido todas as pessoas a pensarem de forma mais consciente. A Agenda 2030 da ONU está aí com os 17 ODS (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável). Se cada um de nós fizer um pouquinho, já estaremos contribuindo para um planeta melhor.”

Além disso, a coordenadora da ACP ensina que separar o lixo e encaminhá-lo a cooperativas pode gerar renda. “Hoje temos empresas que pagam R$1,50 por litro de óleo de cozinha usado. São práticas acessíveis que não exigem grandes investimentos. E não tem coisa melhor do que cuidar do planeta e ainda sentir o retorno disso.”

Lucas Quirino
Reportagem

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